sexta-feira, 29 de abril de 2011

Ensaios Sobre o Arrebatador Amor De Uma Só Transa (parte2) - Revisitado

Sem muitas esperanças, Paul retorna a sua casa e tem planos imediatos de mudança em sua vida, seu momento é revolucionário, sua vida urge por novas experiências, novas razões para seguir em frente, mesmo que seja sem sua fiel companheira de muitos anos. A pressão para que pudesse dizer algo determinante para isso deixava-lhe suando em bicas, e sua mente estava borbulhante com as lembranças daquela tarde com Anna. As dúvidas persistiam: "E se esta moça me fizer sofrer? Da minha companheira tenho a fidelidade, o respeito, o carinho e o mais importante: os filhos. O que posso esperar desta moça?" Sua cabeça estava a mil, ele precisava reve-la, se certificar que aquilo não houvera sido somente um momento de fraqueza, ou somente uma arrebatadora transa.

Em seu carro, Paul rumina os pedaços de frases e palavras ditas por Anna, e tenta de alguma forma se esperançar de ter aquele amor correspondido. Seria uma tragédia ser negado por aquela beldade, num inverno tão rigoroso, num momento tão célebre, onde o coração clama por palavras que o façam transbordar a cada batida por minuto. -Maldita paixão, pensa ele, já está me tomando a alma! Já não consegue trabalhar, concatenar idéias, atitudes, Paul está dopado, sedado pela simples sensação de querer, ao mesmo tempo que sente tenso, suspenso numa intensa preocupação de ser negado. No Rádio daquele Lincoln Zephyr 1946 o locutor anuncia uma suave melodia de Charlie Parker, o Bird. Era tudo que Paul precisava, e ele rumou até a republica onde Anna morava, precisava ter certeza do quê houvera sido aquela tarde.

A temperatura estava congelante naquele inverno de Chigaco, -20°c com ventos cortantes e uivantes, mas Paul seguira em frente e bate à porta de Anna. Quem atende é seu noivo, surpreso por ver aquele homem tomado de neve em sua cabeça e corpo, ele clama por sua identidade:

- O que deseja, senhor?

Paul, sem saber quem era aquele rapaz, mas sagazmente imaginado quem o mesmo era, rebate:

- Nada, acho que bati na casa errada. Perdão!

- Sem problemas, Senhor!

Ele se demora a fechar a porta tempo o suficiente para que Paul aviste Anna ao fundo, lendo um livro, sem notar muito a movimentação na porta. Por fim, o rapaz fecha a porta e Paul lá continua, aguardando que a mesma lhe dirigisse um olhar que fosse. Ao menos ela precisava saber que ele estava ali, que ele queria ve-la, mas que a interrupção de seu noivo tivera sido providencial para que Paul voltasse para seu carro ainda mais cheio de duvidas sobre o que fazer. Era preciso por os pensamentos em ordem, redescobrir o Norte, e ser frio aos acontecimentos que viriam a seguir.

Ao voltar pra casa, Paul decide presentear sua esposa. Era uma compensação por ter sido tolo ao ponto de acreditar que uma moça tão jovem iria se enamorar por ele. Não foi possivel, sua esposa estava sofrendo mais um de seus surtos psicóticos e podia jurar que Paul estava acompanhado de outra mulher. Ele já estava acostumado com isso, só que desta vez ela poderia ter razão. Em pensamento, ele realmente estava. Usou de toda sua conversa para acalma-la, deu seus remédios, e a mesma voltou a si, aceitando seu pequeno mimo: um relógio de cômoda com caixa de música embutida. Ela ficara fascinada com o presente, e os dois decidiram jantar fora, deixando as crianças com os vizinhos. Aquele homem que começara sua epopéia extraconjugal pulando de bar em bar, indo a inferninhos de jazz durante a noite em busca de algo intangível, estava, de novo, rebuscando o amor de sua antiga paixão. Mas era tudo um xiste de sua imaginação, ele ainda tinha Anna em sua mente, e não havia nada que ele pudesse fazer.

Paul deixa sua esposa em casa e segue para o primeiro bar ainda aberto às 10 horas da noite. Era o Midnight Boom Boom, um jazz club frequentado por homens e mulheres negros. Naquele tempo, o norte dos E.U.A não era segregado, mas os negros procuravam manter suas origens em lugares próprios. Paul adentra mesmo assim, ele precisava de um jazz fervilhante, algo que lhe fizesse espantar alguns fantasmas de sua mente, e mesmo com o olhares atravessados dos frequentadores, ele pediu seu usual bourbon com gelo. Assim fora o restante da noite, e Paul bebia vada vez mais. Seus cabelos, antes bem penteados, já se desgrenhavam com o exagerado calor do local, e com o ritmo desenfreado daqueles jazistas no palco. É quando ele decide ir ao banheiro, e é abordado por três rapazes do bar.

- O senhor não percebeu que seu tipo não é bem vindo aqui? Diz um dos rapazes.

- Que tipo? Tipo melancólico? Sorri Paul no alto de sua ironia etilica.

- Gente branca não se mistura conosco, e nós não queremos nos misturar com eles.

- Paul contemporiza: Relaxa gente, somos todos iguais. Esta babaquice é coisa de sulista. Querem um cigarro...?

Paul não tem tempo de se defender, e os rapazes o agridem severamente, deixando-o desfalecido sobre o urinol. Seus olhos estão inchados, assim como seus lábios. Alguns dentes tiveram-se perdido e o sangue fluia de sua boca. Os empregados do bar, pressentindo a confusão que aquilo iria dar com as autoridades, jogam Paul no beco atrás da espelunca, e chamam uma ambulância anonimamente. No dia seguinte, Paul está de volta à sua casa, onde sua esposa chora copiosamente por ter dormido só naquela noite, e ainda mais por ver Paul daquela forma. Ele não diz nada e se arruma para ir ao trabalho. Não era momento de dizer nada, era somente hora de digerir a vergonha, suprimir a dignidade, deixar que seus trinta e tantos anos caiam sobre sua cabeça, e se alinhar com sua idade e maturidade. É hora de crescer.

Passaram-se semanas até que tudo se acalmasse na casa de Paul e ele estivera ainda mais concentrado na administração da mesma, dando mais atenção aos filhos, cuidando da manutenção do bem estar de todos da família, papel de qualquer homem numa relação. Anna ainda é um pensamento constante em sua mente, e ele sempre o conduz à dimuição de seu desejo, ao lembrar da cena do noivo na casa dela. Aquilo tivera sido preponderante para tentar esquece-la. No entanto, Paul precisa dizer algumas coisas a ela. Não seria justo deixa-la sem saber que a ama e que estivera lá aquele dia em que seu noivo o antendera. No dia em que se reviram, Anna contou que trabalhava num restaurante/café para sustentar seus estudos e Paul lembrou do nome do local. -Seria certo aparecer por lá, clamando por explicações, podendo prejudicar a moça em seu local de trabalho? Ponderou ele. Ainda assim ele foi, mas seria um cliente no local, e assim poderia, vez por outra, falar algo que pudesse ser importante a ela, com mais discrição.

Ao chegar no Bingo Restaurant and Cafe, Paul já avista Anna no balcão e lhe dá um aceno ainda na entrada. Anna o vê, e dá um sorriso discreto, mas se apressa em pegar sua comanda para lhe tirar o pedido. Paul observa o cardápio e logo chega Anna, dizendo sarcasticamente:

-Olá Senhor, o que deseja?

Paul não resiste, e perde a linha:

-Anna, vim aqui por você!

-Por que não me procurou antes? Já fazem meses que você não deu sinal de vida, diz Anna.

-Eu tentei, mas você sabe, sou casado, tenho filhos, estive com muita coisa na cabeça ultimamente...aquele dia foi demais pra mim.

-Eu compreendo, mas prefiro que você não me procure mais.

Paul muda seu semblante, e perde ainda mais a linha:

Ora, por que? O que te fiz?

-Não faça cena, eu trabalho aqui! Se quiser conversar, venha aqui às quatro da tarde. É minha hora de ir embora, e aí poderemos esclarecer algumas coisas.

Paul balançou positivamente a cabeça e pediu um café com um saduíche de atum, no que foi prontamente servido e dali se foi, aguardando ansiosamente pelo vespertino período para que pudesse expor sua face mais terna. Enfim, declarar-se.

continua...