sexta-feira, 19 de março de 2010

Mais Um Dia Brasileiro.

Sempre falei da psiquê do brasileiro por aqui, das idiotices e contrasensos inerentes ao mesmo no seu comportamento perante a sociedade. São coisas de um povo que ainda está em evolução, muito jovem ainda para aceitar os termos de uma civilização moderna como educação, cordialidade, honestidade e senso de comunidade. Ainda chegamos lá.

Por exemplo, ao retirar meu carro de uma vaga de estacionamento por aí, me deparei com uma situação corriqueira, mas que demonstra essa qualidade de cidadão. Olhei para a parte frontal do meu veículo, mais precisamente o parachoques, e vi um afundamento. Naturalmente olhei para o veículo da frente, e percebi que o mesmo carregava um apêndice em sua traseira, mais conhecido como "engate". Aquela bola de aço, envolvida por uma proteção de mesmo material foi a causadora daquele estrago no meu veículo. Dadas as coincidências de altura e o encaixe perfeito da mesma no meu estrago, conclui que aquele veículo havia feito uma manobra de estacionamento que me causara aquilo. Puro descaso. Analisando a fundo, comecei a pensar que aquele motorista poderia ter que puxar alguma coisa, como um barco ou um carrinho de pastel, por isso necessitava daquele item em seu veículo. Depois ponderei de outra forma, quero dizer, existem milhares de veículos por aí usando este acessório, né? Seriam os brasileiros então devotos da arte de rebocar coisas com seus carros? Não, sempre que os vejo por aí dirigindo, só vejo o engate puxando nada mais do que ar. Concluo que seja pura e simplesmente uma questão de egoísmo intrinsicamente nacional. Na verdade, o brasileirinho quer manobrar seu carro, sem se preocupar com quem está atrás, e não danificar seu próprio parachoques traseiro. Ou seja, a famosa frase da lei Gersoniana: Levarei vantagem em tudo! Ou melhor, vou ver o meu lado. Você que se dane, eu vou dar marcha à ré!

Definitivamente, este país não é para otários que nem eu. Depois disso, acho que não resta mais nada em se tratando de carros. Podemos fazer como no filme "Mad Max", lembram? Colocar aqueles espinhos, correntes, metralhadoras etc. nos carros e sair por aí preparados para danificar o bem dos outros, mantendo os nossos intactos. Mas não termina por aí. Um cara de engate estava na minha frente num engarrafamento daqueles bons em SP capital. Ao que pude perceber, o mesmo tomava um líquido refrescante naquele dia calorento. Terminou de tomar, e não se fez de rogado: jogou a garrafa do tipo PET pela janela, aterrissando a mesma no canteiro central, a uns dois metros de um bueiro. Meu sorriso irônico não foi maior do que a vontade de ver aquele ser, à minha frente, entrar em autocombustão e queimar até a morte. Pensei comigo: Este é o mesmo canalha que, quando cai um temporal em SP, enfrenta uma enchente de matar até rato afogado, e sai reclamando do poder público, dizendo ser vítima do descaso governamental com a população. É - pensei - ele tem um engate, pode muito bem decorar a cidade com garrafas PET pelas ruas. Provavelmente, depois de ter tomado todo aquele líquido, deve ter sentido vontade de urinar. Ora, para que segurar? Mija na rua mesmo. Urinar na rua ainda é um esporte dos mais praticados pelos brasileiros, seja em época de festas, ou no dia a dia mesmo, quando têm vontade.

De longe vejo um motoqueiro pelo meu retrovisor. Ouço o barulho da buzina, agudo e estridente já por um tempo. Ele passa do meu lado e, com um chute certeiro, me destrói o retrovisor direito do veículo. Atrás, vem uma outra leva de motoqueiros e, buzinando, passam por cima do meu já esfolado retrovisor, num certo tom de vitória, ou até escarnio. Pensei, o que teria eu feito, aqui parado no tráfego, para merecer uma ato de violência tão extremo assim? Ah, sim. Meu carro estava um pouco a direita, com as rodas quase que por cima da faixa onde os mesmos trafegam, ilegalmente. Não poderia tirar satisfações, a moto já havia sumido há muito. Não poderia consertar aquilo na hora, a peça estava condenada. O que fazer? Nada. Sentar e esperar o tráfego andar. Claro, não esquecendo de analisar aquele rapaz, e sua fúria sobre duas rodas. Seria tão necessária assim a atitude impensada de danificar o bem alheio? Que tipo de lição ele queria me ensinar? Teria ele tido satisfação ao fazer isso? Não era para tanto, ele era só mais um brasileiro. O atentado contra o meu retrovisor talvez representasse toda a tristeza que um homem pode carregar em sua vida, ao trafegar num meio de transporte tão inseguro quanto uma moto. Ou na verdade foi só um meio de expressão de um aspirante a marginal. Seja qual fosse, a atitude foi bem peculiar, e ilustrativa do comportamento do nosso cidadão.

No fim daquele dia, olho para o lado, num semáforo. Um homem me pede esmola, com tremores pelo corpo, denotando um peculiar comportamento de quem está há muito tempo sem o objeto de seu vício. Ele está com uma criança, com não mais que 1 mês no colo. Me vejo numa situação complicada, se não dou o dinheiro, me condeno por estar negando algo benéfico para aquela famigerada criatura pequena. Se dou o dinheiro, igualmente me condeno por sustentar o vício de um homem que precisa de ajuda, e que não vai obtê-la se tiver dinheiro fácil nas mãos. O dilema me durou pouco, dei o dinheiro. Achei que estava me redimindo de meu próprio julgamento ao pedir a ele que fosse comprar roupas para a criança, e para que a tirasse daquele sol de fim de tarde. Doce ilusão a minha. Ele foi se drogar, e aquele bebê vai ficar, mais uma noite, ao relento. Não posso me queixar. Era só mais um brasileiro, e um pequeno brasileirinho, lutando para sobreviver num país onde a sociedade os ignora. Sim, nove em cada dez veículos daquela leva de semáforo não deram nada àquele individuo. Como brasileiro e crítico, acho que para nós, é mais fácil ignorar o problema do que tentar solucioná-lo, acusando o poder público por isso. Chegamos ao ponto de ficarmos tão cínicos, que na esquina seguinte já esquecemos do que vimos. Talvez chegamos em nossas casas, e até dormimos muito bem, com nossos filhos saudáveis e alegres.

Uma sucessão de infortúnios podem muito bem refletir o quanto este país precisa evoluir. Nossa histórica estupidez perante as mais sensíveis questões da nação é uma característica que segue latente, mas dá sinais que está melhorando. Não me vejo usufruindo do grau de evolução alcançado pelas nações européias ou asiáticas aqui no Brasil. É algo que demanda tempo, dedicação e comprometimento do próprio cidadão para com seus iguais. Aquela velha temática do levar vantagem em tudo tem que desaparecer da nossa personalidade. O vantajoso para todos é mais importante e deve prevalecer. É assim que se constrói uma nação. Temos que melhorar!

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